Capítulo
VII
O Dr. Odorico Josh Jonh reúne os
membros da organização para mostrar sua nova criação científica, a
reconstituição física do deputado Samir de Souza. Uma casa retirada no subúrbio
de Porto Citty, aspecto sombrio, sala com pé direito alto, luminárias antigas
penduradas no teto e uma enorme mesa redonda com a presença dos principais
líderes da Quadrilha da Luva. “Estamos num belo momento histórico, prontos para
contemplar o limiar da ciência do terceiro milênio em Porto City”. Os aplausos
irrompem num misto de expectativa e excitação. “Minha criação não tem nada a
ver com o que o meu ídolo, o Dr. Frankenstein, criou. Vocês vão ver algo muito
mais arrojado, um verdadeiro desafio no que concerne às técnicas de
aperfeiçoamento humano. Trata-se do primeiro transplante de cabeça e pescoço, humanas, feito
na América do Sul”. Ouve-se um sinal de tumulto “A ciência da América Latina
está cada vez mais desenvolvida e...”, de repente um grito de mulher interrompe a fala do Dr. Odorico. “Anda
logo seu filhadaputa, chega de discurso, quem dá discurso sou eu”.
O Dr. Odorico vai até o final da
sala, abre uma cortina de onde a voz saiu, todos se espantam com a bizarra figura de um corpo de paletó
e gravata, em pé, falando e esbravejando, com uma voz e cabeça completamente
feminina. Na entrada que separa o pescoço do tórax, uma gola branca levemente ensangüentada bem no local onde fica a costura do corpo do deputado Samir de Souza e a
cabeça de sua amante, Rosalva Gomes da Luz. Nos rostos dos participantes, uma
expressão gélida de pavor. Mostarda, trêmulo, levanta sua taça de vinho bordô e
meio inseguro grita para todos “Vamos saudar o deputado com um glorioso viva”,
todos levantam suas taças e gritam ao mesmo tempo: “Viva nosso deputado”.
O
deputado circula por entre os membros da quadrilha e fala. “Vocês
sabem que sou uma pessoa muito pragmática. Aquela vaca da Arabela explodiu
minha cabeça, mas meu cérebro ficou intacto e o Dr Odorico teve de me colocar na cabeça dessa vagabunda que vocês estão vendo agora. Sim, porque
Rosalva me traiu e eu a matei congelada numa câmara frigorífica. Para minha sorte, pois meu cérebro foi transplantado na cabeça da vadia e eu estou aqui. Alguém quer comentar alguma coisa?”
O coronel Artaxerxes Moura
levanta o dedo e fala, com voz trêmula: "Sr. Deputado, seu pescoço está cheio de
vinho”, “Isso não é vinho, imbecil, é sangue, esse médico de araque costurou a
cabeça da vaca no meu corpo como se estivesse costurando um cachorro. Vou cortar metade da verba de suas pesquisas”. O Dr. Odorico dá um sorriso amarelo enquanto há silêncio e mal estar geral. “Desculpe, Sr. Deputado”, diz o coronel.
O deputado liga um retroprojetor e começa a passar imagens sucessivas
de todas a cracolândias de Porto City. “As imagens
que vocês estão vendo, é sobre nosso próximo plano para dominarmos
definitivamente Porto City e depois disso, o Brasil e talvez toda a Amércia do Sul. Como vocês puderam notar, a ideia dos Zumbis falhou porque o antídoto
caiu nas mãos daqueles dois. Isso mesmo, Arabela, Beringela e até aquele gato agourento, juntaram-se à oposição, contra mim. A ação dos zumbis não foi a esperada, acabamos por descobrir que a ação dos zumbis brasileiros não são iguais os da América do Norte. Os de lá vão logo devorando tudo pela frente, os nossos são
pacíficos, ficam vagando pela cidade exalando mal cheiro mas não fazem porra
nenhuma". Razão pela qual, vamos transformar Porto City na maior cracolândia do mundo. Os usuários de craque são mais ativos que os zumbis, se ficam sem a droga, tornam-se agressivos e com um ship instalado eles vão infernizar a cidade, tudo controlado por nós.
Os membros da quadrilha levantam suas taças de bordô e gritam juntos, capitaneados por
Mostarda: “Viva Porto City, a maior cracolândia da América do Sul”. Dão gargalhadas coletivas e parecem felizes com o novo plano. O deputado, não resiste, e bebe uma taça de vinho junto com todos, mas sua gola branca vai ficando ainda mais entumescida pelo vazamento entre os pontos de costura da pele do pescoço e do torax. Com a voz esganiçada de Rosalva, fala aos berros. "Esta cirurgia ficou uma merda, Odorico, dê um jeito de contratar um cirurgião plástico pra costurar essa porra".
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